Discurso do Presidente da Câmara, João Grilo
Celebramos hoje o primeiro centenário da implantação da República Portuguesa.
De entre os ideias republicanos que começaram a tomar corpo no dia 05 de Outubro de 1910 e que ao longo de um século, com altos e baixos – do entusiasmo revolucionário ao descrédito, da longa noite da ditadura à revolução de Abril – se foram afirmando na nossa sociedade, um dos mais marcantes, foi, sem dúvida, o desígnio da educação universal e da escola pública e a sua força e importância para a construção de um país virado para o futuro.
A Primeira República passou a afirmar que “o homem vale sobretudo pela educação que possui” e a educação foi encarada como uma forma de aproximar os dois mundos em que o país se dividia então: por um lado, uma minoria letrada que vivia nas cidades, por outro, uma imensa maioria – onde o analfabetismo rondava os 70% - distribuída pelos campos do interior.
Foi, por certo, neste pressuposto que o Governo decidiu, em boa hora, lançar esta iniciativa – simbólica mas ao mesmo tempo marcante – de inaugurar 100 escolas no país, nos 100 anos da república.
Marca a importância que devemos atribuir à educação como factor de sucesso de uma sociedade e é com todo o prazer que a ela nos associamos.
O conhecimento é hoje frequentemente apontado como a maior riqueza das sociedades modernas.
O sucesso de um país estará cada vez menos dependente da riqueza em recursos naturais ou de outros factores históricos ou geográficos, mas antes cada vez mais ligado à sua capacidade de produzir e mobilizar conhecimento ao serviço de novas aplicações.
Para ultrapassarmos a crise que Portugal e a Europa enfrentam – em larga medida resultante de um mundo em acelerada mudança – são necessários novos paradigmas de desenvolvimento, e esta ideia de apostar nas pessoas e no conhecimento que produzem é sem dúvida das mais inspiradoras e mobilizadoras para o momento que atravessamos:
No que toca a cérebros, temos tantos como os outros, a diferença estará no que fazemos com eles.
Portugal precisa de se afirmar no mundo como um país de conhecimento e não de mão-de-obra.
Cabe aos governos, nacionais e locais, a criação de condições de excelência para que estes cérebros despontem, com igualdade de oportunidades em qualquer ponto do país.
Nesse sentido, inauguramos hoje esta fase da obra de reconversão da EBI Diogo Lopes de Sequeira como parte de um reordenamento profundo da Rede Escolar do concelho de Alandroal, iniciado em 2006 com a aprovação da Carta Educativa, e ainda, em larga medida, por concretizar.
Esta Carta Educativa, que preconiza o descontinuar das pequenas escolas e a concentração dos alunos em novos centros escolares, mereceu, na essência e de modo assinalável, o consenso do todas as forças políticas do concelho.
É na base desse consenso, e com os devidos ajustes, que queremos concluir este trabalho. O consenso de que em matéria de educação estamos todos do mesmo lado: o lado da melhor qualidade do ensino para as nossas crianças, jovens e adultos.
Quero assim aproveitar a oportunidade para expressar o agradecimento público desta autarquia a todos aqueles que directa ou indirectamente contribuíram para a realização desta obra.
Mas como muitas vezes acontece em democracia, cabe a uns terminar o que outros começaram.
Sem pretender beliscar a importância da iniciativa ou retirar-lhe o devido mérito... como também acontece não raras vezes, não deixa de ser verdade que a tarefa de concluir um desígnio se revela inexoravelmente mais complexa do que o acto de o iniciar.
No entanto, as populações contam com os seus eleitos para ultrapassarem continuamente as dificuldades e apresentarem soluções, sobretudo em momentos difíceis.
É neste pressuposto que tenho o prazer de anunciar o reinício das obras de construção do Centro Escolar de Santiago Maior para os próximos dias.
A construção do bloco de salas para o Ensino Pré-Escolar, a instalar neste mesmo espaço, e também da responsabilidade da autarquia, será iniciada até ao final do ano.
Estamos a dar os passos necessários para que a reconversão do Pólo Escolar de Terena seja uma realidade no início do próximo ano lectivo.
E também, a última fase da obra onde nos encontramos – construção do pavilhão gimnodesportivo e arranjos exteriores – onde se registava, talvez, o maior dos impasses, conta já com uma solução à vista: num acordo já estabelecido com a Direcção Regional de Educação do Alentejo, a Autarquia irá assumir a realização desta obra, orçada em cerca de 500 mil euros, através de uma candidatura a fundos comunitários.
A Autarquia assume desta forma, com coragem e determinação e apesar do momento difícil que atravessa, a prioridade à educação como uma das chaves do desenvolvimento do concelho. Mas conta, Sr. Ministro, com o imprescindível apoio do Governo a que V. Exa. pertence, para levar esse desígnio a bom porto. Estamos certos de que ele não nos será negado.
Permitam-me uma palavra para todos os que trabalham, aprendem e estão ligados a este espaço. Uma escola moderna e bem equipada constitui um forte contributo para o sucesso educativo, mas não o garante só por si. Uma escola é o que se faz dentro dela. Sejamos capazes de assegurar uma comunidade educativa unida em torno deste desígnio.
Termino com um último apelo.
Esta política não esta isenta de riscos e o decisor não pode ser insensível às preocupações daqueles que vêem o encerramento de pequenas escolas e outros serviços públicos no interior como mais um contributo para a desertificação, para o sentimento de isolamento e perda de qualidade de vida das populações.
Portugal já não é o país dividido nos dois mundos a que me referi no início da minha intervenção, mas existem hoje outras clivagens que nos afastam cada vez mais da ausência de assimetrias e de uma equilibrada ocupação do território tão coerente quanto estratégica.
Vivem hoje no concelho de Alandroal 1/3 das pessoas que aqui viviam há 100 anos.
Não é razoável pensarmos que vamos voltar a ter esta população.
Mas como desenvolver um território sem pessoas?
Pensamos que a resposta está na frente dos nossos olhos: vamos fazer das fraquezas forças e potenciar o que temos de bom.
Aqueles que aqui vivemos e trabalhamos somos os representantes de uma cultura com saberes e tradições milenares que fazem parte do dia-a-dia das pessoas e que a qualquer momento podem ser vividos por quem nos visita.
Somos herdeiros de um legado histórico e patrimonial riquíssimo que confere uma forte identidade ao território.
Praticamos uma agricultura que se traduz numa longa história de relação equilibrada com a natureza, que é única no mundo.
Os valores ambientais e paisagísticos são elevados e a natureza em estado puro está por todo o lado.
Todos estes indicadores, associados à construção e mobilização de novos conhecimentos encerram um enorme potencial de desenvolvimento sustentado para territórios como o nosso, e logo, de atractividade, que deve ser potenciado.
Não queremos continuar a discutir o encerramento pontual deste ou daquele serviço enquanto se anuncia a desertificação do interior como uma fatalidade inevitável a prazo.
Pretendemos antes, sensibilizar os nossos governantes para um novo paradigma de desenvolvimento para territórios de baixa densidade como o nosso que dê oportunidades aos que aqui vivem e que ajude a atrair outros.
O interior tem viabilidade e tem futuro. Precisamos apenas dos apoios certos, das medidas sérias, profundas e corajosas que nos ajudem a dar corpo a este paradigma.
Sr. Ministro, estou certo que enquanto alentejano com a especial ligação que tem ao mundo rural, sente, tal como todos nós, a profundidade do apelo que lhe deixo.
Não sabemos como vão ser os próximos 100 anos da república portuguesa.
Sabemos apenas que se soubermos preparar o futuro, evitando os erros do passado e mantendo vivos os valores e princípios que hoje norteiam a nossa acção, teremos, seguramente, quem saiba reconhecer a importância para as gerações futuras do trabalho que hoje estamos a desenvolver.
Muito obrigado a todos.
1 comentário:
Talvez tenha cometido uma injustiça para com o amigo João Grilo, quando fiz referência, num outro contexo, ao introduzir no discurso o lado mais humanista da educação.
Depois de ler uma segunda vez o texto, dei conta que afinal está contido no parágrafo 24 do discurso, esse lado a que fiz referência na nossa troca de mensagens, e que na primeira leitura por lapso me escapou.
Transcrevo o excelente comentário de Ana Paula Fitas do Poet'anarquista para o MUDA!- "Excelente discurso! ... de facto, as palavras quando dotadas de sentido e significado conferem credibilidade e confiança. Bom trabalho."
Reforçando as suas palavras acrescento: nestes tempos difíceis e conturbados da vida política nacional e internacional em que vivemos, essas palavras fazem todo o sentido, e mais que nunca, é necessário credibilizar as instituições para que as pessoas possam novamente voltar a confiar nelas.
Um abraço para ambos
Enviar um comentário