Público 11.01.2011 - 11:54 Por Idálio Revez, com José António Cerejo
Uma operação em clínicas nacionais custava cerca de 1.900 euros. A Câmara de Vila Real de Santo António pagou uma média de 2.900 euros por doente, incluindo viagem e alojamento.
As despesas efectuadas pela Câmara de Vila Real de Stº António com as operações às cataratas feitas em Cuba, por falta de resposta dos serviços de saúde nacionais aos idosos em risco de cegueira, são consideradas "ilegais" pelo Tribunal de Contas (TC). Uma auditoria efectuada às contas da autarquia detectou que foram gastos cerca de 640 mil euros com o tratamento dos doentes enviados para Cuba entre 2007 e 2009.
A contratação dos serviços médicos e de transporte necessários para viabilizar as cirurgias em Cuba não foi objecto de "concurso público ou concurso limitado por prévia qualificação", pelo que os pagamentos efectuados "são ilegais e susceptíveis de configurar eventual responsabilidade financeira sancionatória", com a aplicação das multas correspondentes.
Fazendo as contas, com base nos totais de despesa e no acordo entre as autoridades cubanas e o município, referidos pelo TC, verifica-se que terão sido tratados em Havana cerca de 220 doentes, com um custo médio para a câmara da ordem dos 2.900 euros - incluindo a cirurgia (1300 euros), mais viagens e internamento.
O presidente da Câmara de Alcoutim, Francisco Amaral (PSD) - pioneiro neste tipo de iniciativas das autarquias -, diz que pagou, em 1999, 75 operações aos olhos, numa clínica de Faro, "por menos de mil euros" cada uma. Por isso, diz, quando foi contactado para enviar doentes para Cuba, respondeu: "Não, muito obrigado". Amaral diz, porém, que a mediatização deste caso, feita pelo seu colega de Vila Real de Stº António, Luís Gomes, também do PSD, teve o "mérito de envergonhar o Governo".
Em 2008, o grupo HPP Saúde - proprietário das clínicas de Santa Maria, em Faro, e Hospital Privado S. Gonçalo, de Lagos - propôs a várias câmaras do Algarve e Baixo Alentejo a realização de operações às cataratas a mil euros por cada olho. As intervenções aos dois olhos, efectuadas em dias distintos, ficaria por 1.900 euros.
A presidente do Conselho de Administração do Hospital de Faro (HDF), Ana Paula Gonçalves, reconhece que há quatro anos esta unidade de saúde apresentava um défice na especialidade de Oftalmologia: "Só tínhamos um médico" e o tempo de espera para uma consulta era "bastante elevado". Por isso, após a polémica dos doentes enviados para Cuba, o hospital recebeu autorização do Governo para contratar especialistas, com a missão de acabar com as listas de espera. A situação, acrescenta, está agora "razoavelmente normalizada", com cinco oftalmologistas ao serviço.
David Barros Madeira dirigiu uma das duas equipas de especialistas exteriores, contratadas pelo HDF, para colmatar a falta de oftalmologistas. "Fizemos num ano 1.920 cirurgias". O preço pago à equipa por doente, afirma Ana Paula Gonçalves, oscilou entre os 400 e os 650 euros. Sobre os doentes tratados em Cuba, o médico, que observou alguns deles no pós-operatório, concluiu que a técnica utilizada em Havana está ultrapassada. "Não digo que eles tenham sido mal operados, mas a técnica usada é idêntica ao que se fazia em Portugal há 20 anos". Barros Madeira diz também que as operações aos dois olhos com um intervalo de tempo muito curto, como sucedia em Cuba, não é aconselhável: "Clinicamente, está errado. É grande o risco de infecção", afirmou, referindo que espera normalmente um mês entre cada cirurgia.
Autarca algarvio rejeita conclusões dos auditores do TC
"Tivémos uma atitude solidária com as pessoas. Demos uma pedrada no charco e ainda somos criticados", diz Luís Gomes, rejeitando as conclusões da auditoria. O autarca garante que foram tratadas em Cuba cerca de 300 pessoas do concelho, das quais um pouco mais de 200 foram operadas às cataratas e as restantes a problemas de Ortopedia e outros.
No caso das cataratas, afirma, tratou-se quase sempre de cirurgias aos dois olhos, com intervalos de cinco dias. Os vários acordos firmados com os cubanos, garante, contemplavam não só as cirurgias, como um check-up total, o tratamento das patologias identificadas e 12 dias de internamento. Cada doente, no caso das cataratas, ficou em cerca de 2.000 euros ao município, assegura, afirmando que o valor pago a Cuba era de 1300 por doente e a viagem uns 700 - o que está longe de bater certo com os números do TC. "Onde é que em Portugal, nessa altura, se conseguia fazer isso por 2.000 euros?", pergunta, reivindicando o facto de essas cirurgias terem baixado no Algarve para os actuais "600 a 1.000 euros por olho" nos privados, e ainda o facto de o Governo ter posto mais médicos nos hospitais. "Por isso deixámos de levar as pessoas a Cuba para tratar as catratas, mas continuamos a levá-las noutras áreas."Em 2007, frisa, dizendo que tem orçamentos desse ano, "os preços mais baixos nas clínicas eram de 1.500 a 1.750 euros por cada olho". Quanto à necessidade de concurso público, Luís Gomes diz que já respondeu ao TC que o entendimento do município é o de que ele não era necessário.
2 comentários:
Cataratas é o que pelas vistas de alguns não faltam.
Todos sabemos o que um certo senhor andou a fazer por Cuba com o seu séquito, o que ele nunca imaginou é que tudo se iria saber... e ainda há quem o venha defender tentando meter tudo no mesmo saco!
Foi o nosso dinheiro, o dinheiro dos contribuintes e não tinha o direito a fazer isso a quem nele depositou confiança.
Alguns relatos de acompanhantes nessas viagens dizem bem dos seus intuitos e despesismos!
Mas pelos vistos o povo gosta muito de adorar este tipo de mafiosos!
A JUSTIÇA TARDA, MAS RARAMENTE FALHA.
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